segunda-feira, 2 de julho de 2012

meu choro


caí de dor quando acordei e
chorei praguejando a culpa e não os culpados
só por eles não existirem em essência
tão concretos como a culpa na realidade

tive um sonho injusto comigo
que me mostrava que eu era aceito
mostrado em vídeos e fotos feliz
na outra cidade que eu existo
onde eu conhecia todo mundo
e arranjava caronas por ter tantos amigos
e era fácil conversar com garotas
quando o assunto surgia do aparente vazio

e de onde me veio um grande amigo
engraçado e cuja animação me incentivava
pelo inesperado que era sua nova constância

falava com qualquer um abertamente
como se me fosse natural ter a correta presunção
de que todos me entenderiam

como também surgiu aquela que
certa vez já esteve comigo e lá
lamentava o fracasso do atual estar com alguém
não que eu desejasse mas que apenas fosse

enquanto todos falavam comigo
e me deixavam à vontade
e durante a carona eu só pude pensar
que podia estar me enganando
não era possível estar feliz alí
não era possível que eu estivesse em paz com a cidade
eu nunca estive em paz com a cidade

mas o sonho me foi ingrato
porque eu até acreditaria em tudo isso
como um bom presságio um bom sinal
não fosse a sua sequência torturante
que me tirou toda a sua ilusão
e me atirou para a dor em que acordei
quando me vi em casa com minha mãe
a mesma mãe que há duas semanas
carregamos pálida dentro do mogno

e o sonho me jogou numa conversa
onde eu contava casos de outras pessoas doentes
essas que conseguiram se curar
ou até que viveram muito mais do que o esperado
- foi isso que me fizeram por dois anos aqui fora -
e me disparava para a cozinha com ela na sala
me pedindo algo pra comer que fosse doce
em sua comum confusão de ordem
de raciocínio com sua mente fragilizada
mas ainda assim raciocinando

pediu um pedaço de bolo
não só pediu como em sua franqueza
pediu para que eu dividisse com ela um pedaço de bolo
como eu poderia não acordar em dor
como eu poderia dividir o pedaço de bolo?
e ela pediu suco
e eu me lembro de ter pensado
sobre ela realizar esses desejos dela
enquanto pudesse e lembro ainda
que o enquanto pudesse me parecia muito com
em pouco tempo e parecia muito com só hoje
mas não me veio que isso fosse sonho
que enquanto pudesse fosse enquanto sonhasse
e eu acordei sem querer

mas não que fosse sonhar para sempre
jamais te prenderia por mim, mãe,
nos é inescapável a sua fuga
ela vem todo dia quando abrimos o olho
e quando seguimos andando e vivendo o dia
e voltamos para a cama à noite
é a mesma coisa todo dia
jamais te prenderia em um sonho
um sonho tão ilusório e falso
tão mesquinho e egoísta onde tudo estava quase bem
mas a maioria de tudo estava bem
jamais acreditaria em uma vida assim
em uma realidade que não doesse por dentro

foi melhor assim
de novo foi melhor assim
sempre será melhor assim
mas nunca será sereno assim

cazia

não há um dia
que se passe sem que
aquela verdade
pisque em minha mente,
como um néon azul

um letreiro triste semi-abandonado
que precisa viver
pra lembrar a todos que
havendo ou não vagas
há o hotel

Troco os sapatos, furados, velhos,
passeando objetivo pelas ruas
"enquanto a chuva molha meus pés
sentenciando-me um eterno sujo"
e ando muito devagar, porque dói
desde quinta-feira, o corpo,
por querer. a mente e o corpo
agora estão em harmonia, quebrados.

Revisito os cômodos, todos,
pensando nos rastros impensados
que deixara, assim mesmo, no passado do passado,
quando o presente ainda não se manifestava impossível,
e não vejo nenhum sinal de rastro que não esteja vivo.

"Você vive apenas duas vezes"
olho a paisagem de dentro do banheiro pra fora,
a casa é um mosaico de vidros